Na análise dos fatores que precipitam as alterações psicológicas e comportamentais nas pessoas com Alzheimer, como no exemplo anterior do banho, muitas vezes chega-se à conclusão de que a comunicação feita de maneira equivocada, no tom e no conteúdo, é justamente o gatilho.
Em pesquisa publicada em 2020, pela Dra. Darina Petrovsky, da Universidade da Pensilvânia, metade dos familiares cuidadores relataram que gritavam ou usavam tom muito severo com a pessoa com demência por elas cuidada em muitos momentos. Isso mostra o quanto essa questão da comunicação é comum! Nesse mesmo estudo, o estresse do cuidador e a depressão mostram-se como associados à uma pior capacidade de comunicação dos cuidadores, ou seja, quanto maior os níveis de Estresse do Cuidador na Doença de Alzheimer (ECDA) e de depressão, mais rude os cuidadores eram na forma de falar com seus familiares com Alzheimer. O risco é de se desenvolver um ciclo vicioso, quanto mais gritos, mais alteração de comportamento, e quanto mais alteração de comportamento, mais estresse e mais gritos.
Tento evitar que isso aconteça com as famílias que cuido. Diariamente, explico-lhes sobre a necessidade de aprenderem a comunicar-se de maneira mais tranquila, mais simples e mais assertiva com seus familiares com demência. Muitos, no entanto, demoram para compreender isso. Às vezes penso que alguns casais passaram décadas discutindo, tendo as briguinhas como diversão e, mesmo após o Alzheimer, os familiares insistem nessas mesmas formas de comunicação.
Nas explicações que faço a esses familiares, mostro que as demências, e no caso o Alzheimer, prejudicam inicialmente algumas funções cognitivas, como a memória recente. No entanto, com o passar do tempo, outras capacidades também são parcialmente comprometidas, entre elas a linguagem e a atenção. Somando essas limitações às dificuldades em audição, comuns a partir dos 70 anos, é necessário que não mais se insista em conversar com essa pessoa como se ela não tivesse limitações.
Gosto de usar a imagem de um labirinto para explicar como a cabeça do familiar pode estar naquele momento, quando está mais confuso, ou mesmo irritado ou com apatia. A tarefa do cuidador é, muitas vezes, em pegar o seu familiar pelas mãos e o guiar dentro desse labirinto. E, esse tipo de cuidado, de afeto tranquilizador, é exercido através da comunicação, tanto verbal quando não-verbal.
Por outro lado, quando se tenta forçar a barra para que ele lembre de fatos recentes, estimular e manter brigas por assuntos triviais, comunicar notícias estressoras em vão, por exemplo, podem precipitar ansiedade e desconforto na pessoa com Alzheimer. Assim como fazer muitas perguntas na sequência ou puxar conversas em ambientes barulhentos também pode gerar erros de compreensão.
Em diversos momentos, a pessoa com Alzheimer, em especial a partir do estágio moderado, pode ficar irritada ou resistente a tarefas como alimentação ou o banho por justamente não compreender bem o que está acontecendo.
Quando o cuidador está estressado ou adoecido, ele perde a capacidade de se comunicar com assertividade e com ternura, o que, como disse, pode desencadear mais sintomas no idoso com demência. Pode se iniciar, dessa forma, um ciclo muito ruim, de brigas, alterações de comportamento, culpa e sofrimento de todos.
Nem sempre vai ser fácil, mas vale tentar.
Cuide de como você fala, se está dando tempo para que as respostas venham, se a comunicação está sendo feita com carinho.